A entrevista como Décio Karam, membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), Ph.D, pesquisador de Manejo de Plantas Daninhas na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), está enriquecendo ainda mais o conteúdo especializado do blog Empreendedores do Campo. Com autoridade de quem estuda o assunto há vários anos, ele fala sobre as vantagens da safrinha, que são muitas e vão desde a lucratividade para os produtores, até a conservação do solo e o controle natural das ervas daninhas.
Décio Karam é engenheiro agrônomo formado pela Escola Superior de Agronomia de Paraguaçu Paulista (1983), possui mestrado em Agronomia (Produção Vegetal) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) e doutorado em Weed Science pela Colorado State University, CSU, Estados Unidos. Já liderou diversos projetos de pesquisa e ministra palestras sobre os mais diversos temas correlacionados à Ciência das Plantas Daninhas, entre eles o manejo integrado de plantas daninhas.
Entrevista:
Quais as vantagens da segunda safra para os produtores rurais?
Décio Karam: Economicamente podemos dizer que o produtor quando utiliza uma segunda safra tem um rendimento operacional aumentado com redução da ociosidade dos equipamentos, diluição dos custos fixos e otimização do uso dos recursos humanos. Tecnicamente o produtor tem maior sustentabilidade de sua propriedade, melhor manejo dos fatores bióticos redutores de produção (insetos-praga, doenças e plantas daninhas). A sucessão ou rotação de culturas facilita o rodízio de produtos químicos o que é fundamental para o manejo de resistência aos defensivos.
Com o uso da segunda safra o produtor permanece com o solo coberto por maior tempo o que contribui para o controle do efeito negativo de intempéries como erosões do solo. A cobertura do solo com restos culturais ajuda a baixar a temperatura e a manter por mais tempo a umidade do solo o que contribui para uma maior atividade microbiana dele. A matéria orgânica e a maior atividade microbiana indicam a melhor qualidade do solo para a implantação das culturas a serem cultivadas.
No Sul do Brasil há um programa que incentiva o plantio de grãos e pastagem após a colheita do tabaco. Em 2020, a safrinha de 150 mil produtores rendeu R$ 634 milhões com o cultivo de 12.878 hectares com feijão, 89.530 com milho, 15.832 com soja e 35.030 ha com pastagens. Qual sua opinião sobre essa iniciativa?
Décio Karam: Quando falamos em agricultura sustentável temos que imaginar um sistema de produção na qual o produtor trabalhe com otimização das áreas para obter maior rentabilidade econômica e melhor ganho tecnológico. A produção de fumo está concentrada em pequenos produtores que geralmente utilizam de mão de obra familiar. Portanto é louvável esta iniciativa e não tenha dúvidas de que esses produtores orientados pela assistência técnica fazendo uso das tecnologias mais apropriadas para a região reduzirão seus custos fixos e aumentarão sua lucratividade.
É possível que a safrinha venha a representar ainda mais retorno econômico? Se sim, o que deve ser implementado para que isso ocorra?
Décio Karam: Sim, a safrinha sempre será uma alternativa econômica pois uma das tendências é nós pesquisadores aprimorarmos os estudos para que sempre haja ganho de produção, seja estes estudos baseados em genética, manejo fitossanitário, manejo da fertilidade, entre outros. Um exemplo do que falo é o crescimento do milho safrinha no Brasil que do nada na década de 70 chega a representar 75% da produção nacional de milho na safra 2019/20. Esse patamar só foi conseguido devido à iniciativa dos produtores em busca da otimização de seus custos na propriedade e da ciência na viabilização do conhecimento para que a cultura sofra, por exemplo, o menor impacto causado pelas variações climáticas e/ou ataque de pragas, para que os materiais genéticos alcançam a campo o potencial produtivo conhecido na seleção experimental.
O produtor precisa estar atendo na escolha da cultura a ser implantada na segunda safra para o seu sistema produtivo, já que muitas vezes o que é viável para um produtor não é para o outro. Uma primeira ação do produtor seria a de utilizar materiais genéticos adaptados as condições climáticas do local. Após esta seleção mais adequada, a condução da lavoura é que irá contribuir para o alcance do potencial produtivo. Um plantio realizado de forma correta, onde a distribuição de sementes ou mudas seja o melhor arranjo produtivo pode ser considerado como primordial no sucesso a ser obtido. Um plantio mal feito com densidades populacionais baixas ou distribuídas de forma aleatória no campo é certeza de quebra de rendimento da lavoura. O manejo da fertilidade, dos insetos praga, das doenças e plantas daninhas de forma eficaz são também fatores fundamentais para produtividades elevadas. Portanto, a condução técnica da lavoura é de estrema importância para que o produtor consiga obter ganhos econômicos com a agricultura em sua propriedade.
A segunda safra pode apresentar também vantagens relacionadas ao controle de plantas daninhas nas lavouras?
Décio Karam: Sim, sempre o manejo de plantas daninhas será favorecido quando do uso de uma segunda safra. Quando o produtor trabalha com apenas uma safra a tendência é de que as áreas onde não ocorre o cultivo sejam deixadas de lado em pousio, onde as plantas daninhas irão completar seu ciclo reprodutivo depositando grandes quantidades de semente no solo. Isso acarretará maiores infestações quando do uso da terra para o plantio da cultura desejada. Quando se usa a segunda safra o produtor inicia o planejamento da safra com o pensamento do controle de plantas daninhas pois este é um dos maiores problemas verificados mundialmente como fator de redução de produtividade quando essas não são manejadas.
Com a segunda safra, o produtor, caso for utilizar o plantio direto, já deve fazer uso de uma tecnologia de manejo de plantas daninhas antes do plantio. Na condução da lavoura, esse mesmo produtor fará uso do manejo pelo menos mais uma vez. Essa atitude reduzirá a produção de sementes das plantas daninhas de forma drástica resultando em facilidade, economicidade e sustentabilidade do sistema de produção utilizado.
Outra grande vantagem em relação ao manejo de plantas daninhas é de, no uso da segunda safra, o produtor terá maiores opções químicas para manejar plantas daninhas resistentes a herbicidas. Uma das premissas para o controle de plantas daninhas resistentes a herbicidas é fazer uso da rotação de mecanismos de ação de produtos. Essa técnica diminuiu a possibilidade de seleção de plantas daninhas resistentes o que incorrerá em maiores facilidades e menores custos para seu manejo.