Dia da Mata Atlântica: como conservar?

Em 27 de maio é celebrado o Dia da Mata Atlântica, data para refletir sobre a situação do grande bioma que cobria 15% do território brasileiro, descendo por 17 estados brasileiros do Alagoas até o Rio Grande do Sul. Estudos apontam que restam apenas 12,4% da floresta que existia originalmente. Por isso, diversas ações buscam a conservação dos remanescentes e sua biodiversidade. No Sul do Brasil, uma iniciativa que deu certo foi o incentivo ao cultivo de espécies florestais energéticas para a preservação da mata nativa. A ação do setor do tabaco, produto cultivado por pequenos produtores diversificados, fomenta o plantio de eucaliptos para suprir a demanda de lenha e madeira nas propriedades, fazendo com que as espécies nativas permaneçam intocadas.

Para falar da importância do bioma Mata Atlântica e o que deve ser feito pela sua preservação, o blog Empreendedores do Campo entrevistou o professor Jorge Antônio de Farias, que possui larga experiência em gestão e planejamento florestal. Engenheiro Florestal, com doutorado em Manejo Florestal e Economia Florestal, Farias é professor do Departamento de Ciências Florestais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e coordenador do Projeto Ações pela Sustentabilidade Florestal na Cultura do Tabaco. Leia abaixo a entrevista.

Em maio comemora-se o Dia da Mata Atlântica. Qual é a situação atual do bioma?

Jorge Antônio de Farias: A Mata Atlântica é o bioma mais ameaçado do Brasil, e talvez agora esteja perdendo a posição para o bioma Pampa por causa da invasão da soja. Mas, ficando nos biomas que têm formações arbóreas, a Mata Atlântica é, com certeza, o mais degradado. Primeiro porque a imensa maioria da população brasileira está dentro desse bioma e foi por aí que começou toda a ocupação do território brasileiro. Porém, a boa notícia é que os níveis de cobertura têm se mantido relativamente estáveis, com ligeiras oscilações, e isso é resultado da consciência da população e da melhora da instrumentalização da cidadania. A delegação aos municípios de muitas ações de fiscalização e licenciamento está repercutindo nesse cenário. As próprias entidades e empresas de diferentes setores que atuam dentro do bioma também têm outro nível de conscientização e atuam de forma bem mais proativa visando a conservação. Mas isso não significa que podemos nos dar por satisfeitos. Temos que nos manter permanentemente vigilantes porque, como o bioma está no meio da antropização do território brasileiro, segue ameaçado, seja pela ocupação urbana ou pela ocupação desordenada da fronteira agrícola, como é o caso da soja. 

O plantio de espécies energéticas beneficia a conservação do bioma? Por quê?

Jorge Antônio de Farias: As florestas energéticas contribuem enormemente para diminuir e até eliminar a pressão sobre as florestas nativas no que diz respeito ao fornecimento de energia. E as plantações comerciais também supriram a demanda por madeira sólida, especificamente na construção civil, serrarias, movelaria, etc. Então, com certeza, as florestas plantadas, como pinus e eucaliptos, têm dado e vão continuar dando uma importante contribuição para a conservação do que restou do bioma Mata Atlântica.

O setor do tabaco vem, desde a década de 1970, incentivando o plantio de eucaliptos nas propriedades rurais para suprir as demandas de madeira e lenha. Pode-se dizer que isso está beneficiando a recomposição de áreas da Mata Atlântica?

Jorge Antônio de Farias: A cultura do tabaco sempre se caracterizou por estabelecer uma remuneração diferenciada para a família rural justamente por ela cultivar uma pequena área. E as regiões onde é cultivado o tabaco Virgínia foi e continua sendo a de maior cobertura de floresta nativa. Isso porque o produtor conseguia auferir uma boa renda com uma lavoura pequena e não precisava desmatar uma grande área da sua propriedade para ter renda a partir da agricultura. Isso foi uma coisa muito peculiar do tabaco e continua sendo até hoje. Eu diria que a cultura do tabaco tem contribuído muito para o resgate e restauração da Mata Atlântica, primeiro pela manutenção das florestas de rápido crescimento, garantindo abastecimento e mantendo a demanda das propriedades por lenha e madeira. E segundo, porque, com o tabaco concentrado numa pequena área e auferindo uma renda satisfatória para a família, o restante da propriedade começa a se restaurar naturalmente e amplia a área de cobertura natural ao ponto de, por exemplo, na região do Vale do Rio Pardo, a gente ter de 35% a 40% de área das propriedades cobertas com florestas naturais em diferentes estágios sucessionais.

As estatísticas da Associação dos Fumicultores do Brasil mostram que a média das propriedades produtoras de tabaco é de 14% de mata nativa e de 8,4% de mata plantada. Esses índices são considerados bons diante da realidade da agricultura brasileira?

Jorge Antônio de Farias: Tenho a convicção de que esses números são maiores. Como os dados da Afubra são de autodeclarações dos produtores, acredito que muitas vezes, o produtor entende que floresta nativa é aquela que nunca foi cortada. Nos nossos trabalhos técnicos e científicos, vemos a floresta nativa nos seus diferentes estágios sucessionais, ou seja, nos estágios inicial, médio, avançado e clímax. Nos trabalhos que temos feito com modernas ferramentas de georreferenciamento, percebe-se que tanto as áreas de mata nativa como de florestas plantadas são maiores.

Além do reflorestamento, de que outra forma é possível proteger a Mata Atlântica?

Jorge Antônio de Farias: A primeira ação fundamental para proteger a Mata Atlântica é a gente exigir a recomposição da reserva legal e das Áreas de Preservação Permanente. Isso é fundamental para qualquer intenção séria quando se fala em restaurar, recuperar ou conservar o bioma Mata Atlântica. A segunda estratégia é desenvolver ações com as comunidades, com a agricultura familiar, porque, predominantemente, o que sobrou de Mata Atlântica ou está em unidades de conservação ou está na agricultura familiar.